As relações luso-brasileiras a immigração e a «desnacionalização» do Brasil

Nonfiction, Religion & Spirituality, New Age, History, Fiction & Literature
Cover of the book As relações luso-brasileiras a immigração e a «desnacionalização» do Brasil by José Barbosa, Library of Alexandria
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Author: José Barbosa ISBN: 9781465564900
Publisher: Library of Alexandria Publication: July 29, 2009
Imprint: Library of Alexandria Language: Portuguese
Author: José Barbosa
ISBN: 9781465564900
Publisher: Library of Alexandria
Publication: July 29, 2009
Imprint: Library of Alexandria
Language: Portuguese
O Brasil já foi uma região mal conhecida. Hoje já o não é. Em todos os centros civilizados deixou de ser ignorado. Existe, emfim! E não existe sómente por ser riquissimo de climas, de flora e de fauna, nem por offerecer, nos seus terrenos inexplorados, largo campo ás ambições insatisfeitas dos povos do Velho Mundo, nem sequer por haver desenvolvido de maneira collossal as suas producções. Tudo isso torna conhecido o Brasil. Mas o que mais lhe propaga o nome é a surpreza causada pela sua cultura, ainda ha pouco representada de modo inolvidavel e memorando pelos seus delegados na Conferencia de Haya e no Congresso de Hygiene de Berlim, Ruy Barbosa e Oswaldo Cruz. O que, além disso, não escapa a ninguem é a supremacia que lhe cabe entre as nações sul-americanas, é a funcção de arbitro da paz do continente, em que o investiram os estadistas da Republica, entre os quaes se tem de destacar a excelsa figura de Rio Branco. Para o Brasil de hoje convergem todos os olhares. Deixou de ser a terra do ouro e dos diamantes para se transformar em vasta arena aberta ás mais levantadas especulações da intelligencia e ás mais audazes e fecundas iniciativas materiaes. O estudo e o trabalho congregam-se para o seu progresso. A liberdade e a paz social acolhem e protegem os desherdados que alli vão buscar pão e esperanças... As sociedades européas, imbuidas de preconceitos e avassalladas pelos privilegios, trancam o futuro ás classes trabalhadoras. Que lhes resta, senão o recurso da expatriação? O caminho é o Oceano; a Chanaan é a America, a livre e egualitaria America, onde o trabalho é toda a nobreza. Nós, os portugueses, acompanhamos o movimento geral. A nossa America consiste principalmente no Brasil. Nem podia deixar de ser assim. A raça e a lingua são factores decisivos na escolha do destino. Nenhuma raça revéla maior resistencia do que a nossa, nenhuma é mais soffredora e tenaz. Como, porém, estamos desapparelhados para a lucta hodierna pela falta de diffusão do ensino, só excepcionaes qualidades ethnicas[1] explicam a posição que ainda cabe á nossa colonia no Brasil. Seria, no emtanto, indigno occultar, neste momento, que essa colonia se encontra sériamente ameaçada pelos nossos concorrentes. Está, aliás, na consciencia de todos esta verdade, que uns calam para lisonjear a nossa colonia no Brasil e outros por não lhe vêrem solução deante da criminosa pertinacia com que os governos dão tudo ás clientellas politicas e negam, por systema, a esmóla do ensino primario aos filhos do contribuinte faminto e esfarrapado! A obra da escola não se concilia com os interesses do regimen, não ha duvida; mas recusem ao povo, forçado a emigrar para não morrer de fome, a instrucção indispensavel para competir com os outros estrangeiros no Brasil e esperem o resultado no volume das remessas de numerario com que acudimos ao nosso balanço economico! O recurso das remessas do Brasil e a exportação que para esse paiz fazemos tornaram-se essenciaes á vida portuguesa. E, como nada se fez para dispensar tal dependencia e nada se procurou para assegurar aquelle estado de coisas, a nossa gente laboriosa, conscia dos riscos que corremos, mas sem noção exacta do problema, recebe com esperança e enthusiasmo todas as idéas apresentadas por pessoas bem intencionadas. Isso bastaria para explicar o côro das adhesões á proposta do sr. Consiglieri Pedroso[2], se não interviessem, no lance, a especial categoria, a illustração e o talento do emérito professor. Discordando, em varios pontos, desse plano de approximação luso-brasileira, dirigi a s. ex.a uma carta aberta a que o Mundo deu a sua larga publicidade e na qual se lia: «O estreitamento das relações de Portugal com o Brasil, dada a vontade que nesse sentido revelam os dois povos, é mais do que facil, porque é inevitavel, porque está nos destinos de ambos. Imaginar, porém, como deduzo dos considerandos de v. ex.a que, precisando nós da seiva do Brasil, temos meio de lhe conferir uma compensação primacial, qual seja a de evitar o risco da desnacionalização que esse povo corre pela entrada cada vez maior de outros elementos ethnicos, é erro profundo que os factos condemnam de maneira formalissima. E, sobre ser um erro, esse juizo levantará contra Portugal e contra os portugueses a hostilidade das outras colonias e das outras raças, alli na mais intima convivencia e na mais constante fusão com a gente lusitana e luso-brasileira. Com tal motivo, qualquer esforço de approximação resultará contraproducente. Não posso, desde que se parte dessa base, dar a minha insignificante collaboração a uma tentativa que tenho por inefficaz, pelo menos. O Brasil precisa de milhões de estrangeiros. Não lhos podemos dar. Ha de procural-os em outros paizes. Mas, como é um paiz que se sabe governar e que nunca, nem sob este nem sob o antigo regimen, deixou de demonstrar sentimentos patrioticos e ardor civico, não corre o perigo, que v. ex.a entreviu na colonização italiana e alleman, de se desnacionalizar. Com mais vagar, em um opusculo, hei de deixar demonstrado quanto estão afastados da realidade os que pensam como v. ex.a. Se houvessemos de iniciar negociações com a idéa de evitar esse supposto risco, creia v. ex.a que os brasileiros, cuja hospitalidade tive durante dezeseis annos e cujo espirito conheço, não agradeceriam o aliás generoso empenho, porquanto nelle veriam menos apreço pelas qualidades de intelligencia e de patriotismo, de que, com justiça, se ufanam muito mais do que das riquezas naturaes da sua patria. Sei que v. ex.a, meu illustre correligionario, só é movido por altos e nobres estimulos. Estou convencido de que só á falta de documentos directos e de observação propria se póde attribuir o desvio do seu grande espirito critico em materia em que estudos especiaes dão a v. ex.a merecida auctoridade. Felizmente, porém, entre muitas idéas de real utilidade que constam da proposta de v. ex.a, vejo uma que me garante que o problema, nas suas linhas mestras, tem em v. ex.a o paladino ao lado do qual se poderão alinhar os soldados da democracia portuguesa e os cidadãos da grande Republica Brasileira. Refiro-me á idéa de procurar approximar os dois povos pela adopção de um espirito commum na legislação de ambos. Nesse ponto estou enthusiasticamente com v. ex.a, porque, não podendo a democracia pura, que é a Republica dos Estados Unidos do Brasil, seguir a evolução regressiva, essa aspiração impõe-nos, a nós portugueses, a marcha progressiva para a situação juridica do Brasil―o que só poderá ser conseguido por uma transformação politica e social, tão almejada por mim quanto por v. ex.a. E comprehendo com que intimo constrangimento quem assim sente teria de obedecer ás regras protocolares do cargo ao pedir ao joven rei D. Manuel a sua cooperação para um emprehendimento que só póde ser levado a bom termo pelos dois povos e que só se desentranhará em realidades promissoras quando a realeza portuguesa constituir méra recordação historica. Faço votos por que v. ex.a veja em breve realizadas as nossas aspirações communs. Se, porém, o nosso esforço interno não chegar para tanto, creia v. ex.a que, para não falharem os seus destinos historicos, o Brasil e Portugal se hão de approximar cada vez mais e cada vez mais intensamente a democracia brasileira ha de exercer fatal acção sobre a nação portuguesa, abreviando os dias do regimen monarchico e apressando o advento da Republica Portuguesa. Não ha mais eloquente lição do que a dos factos. Não ha mais violenta propaganda do que a comparação antithetica dos povos brasileiro e português. E, cada português, que volta á patria, não tarda em sentir a magnitude da acção da Republica no Brasil e em reconhecer a falta das instituições a que lá se afizera. Garanto-o a v. ex.a: se não fizermos a revolução, o Brasil ha de republicanizar Portugal. V. ex.a conhece melhor do que eu o poder da osmose social.» Eis a origem deste trabalho. Julguem brasileiros e portuguêses se as convicções, que elle traduz, carecem de fundamento
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O Brasil já foi uma região mal conhecida. Hoje já o não é. Em todos os centros civilizados deixou de ser ignorado. Existe, emfim! E não existe sómente por ser riquissimo de climas, de flora e de fauna, nem por offerecer, nos seus terrenos inexplorados, largo campo ás ambições insatisfeitas dos povos do Velho Mundo, nem sequer por haver desenvolvido de maneira collossal as suas producções. Tudo isso torna conhecido o Brasil. Mas o que mais lhe propaga o nome é a surpreza causada pela sua cultura, ainda ha pouco representada de modo inolvidavel e memorando pelos seus delegados na Conferencia de Haya e no Congresso de Hygiene de Berlim, Ruy Barbosa e Oswaldo Cruz. O que, além disso, não escapa a ninguem é a supremacia que lhe cabe entre as nações sul-americanas, é a funcção de arbitro da paz do continente, em que o investiram os estadistas da Republica, entre os quaes se tem de destacar a excelsa figura de Rio Branco. Para o Brasil de hoje convergem todos os olhares. Deixou de ser a terra do ouro e dos diamantes para se transformar em vasta arena aberta ás mais levantadas especulações da intelligencia e ás mais audazes e fecundas iniciativas materiaes. O estudo e o trabalho congregam-se para o seu progresso. A liberdade e a paz social acolhem e protegem os desherdados que alli vão buscar pão e esperanças... As sociedades européas, imbuidas de preconceitos e avassalladas pelos privilegios, trancam o futuro ás classes trabalhadoras. Que lhes resta, senão o recurso da expatriação? O caminho é o Oceano; a Chanaan é a America, a livre e egualitaria America, onde o trabalho é toda a nobreza. Nós, os portugueses, acompanhamos o movimento geral. A nossa America consiste principalmente no Brasil. Nem podia deixar de ser assim. A raça e a lingua são factores decisivos na escolha do destino. Nenhuma raça revéla maior resistencia do que a nossa, nenhuma é mais soffredora e tenaz. Como, porém, estamos desapparelhados para a lucta hodierna pela falta de diffusão do ensino, só excepcionaes qualidades ethnicas[1] explicam a posição que ainda cabe á nossa colonia no Brasil. Seria, no emtanto, indigno occultar, neste momento, que essa colonia se encontra sériamente ameaçada pelos nossos concorrentes. Está, aliás, na consciencia de todos esta verdade, que uns calam para lisonjear a nossa colonia no Brasil e outros por não lhe vêrem solução deante da criminosa pertinacia com que os governos dão tudo ás clientellas politicas e negam, por systema, a esmóla do ensino primario aos filhos do contribuinte faminto e esfarrapado! A obra da escola não se concilia com os interesses do regimen, não ha duvida; mas recusem ao povo, forçado a emigrar para não morrer de fome, a instrucção indispensavel para competir com os outros estrangeiros no Brasil e esperem o resultado no volume das remessas de numerario com que acudimos ao nosso balanço economico! O recurso das remessas do Brasil e a exportação que para esse paiz fazemos tornaram-se essenciaes á vida portuguesa. E, como nada se fez para dispensar tal dependencia e nada se procurou para assegurar aquelle estado de coisas, a nossa gente laboriosa, conscia dos riscos que corremos, mas sem noção exacta do problema, recebe com esperança e enthusiasmo todas as idéas apresentadas por pessoas bem intencionadas. Isso bastaria para explicar o côro das adhesões á proposta do sr. Consiglieri Pedroso[2], se não interviessem, no lance, a especial categoria, a illustração e o talento do emérito professor. Discordando, em varios pontos, desse plano de approximação luso-brasileira, dirigi a s. ex.a uma carta aberta a que o Mundo deu a sua larga publicidade e na qual se lia: «O estreitamento das relações de Portugal com o Brasil, dada a vontade que nesse sentido revelam os dois povos, é mais do que facil, porque é inevitavel, porque está nos destinos de ambos. Imaginar, porém, como deduzo dos considerandos de v. ex.a que, precisando nós da seiva do Brasil, temos meio de lhe conferir uma compensação primacial, qual seja a de evitar o risco da desnacionalização que esse povo corre pela entrada cada vez maior de outros elementos ethnicos, é erro profundo que os factos condemnam de maneira formalissima. E, sobre ser um erro, esse juizo levantará contra Portugal e contra os portugueses a hostilidade das outras colonias e das outras raças, alli na mais intima convivencia e na mais constante fusão com a gente lusitana e luso-brasileira. Com tal motivo, qualquer esforço de approximação resultará contraproducente. Não posso, desde que se parte dessa base, dar a minha insignificante collaboração a uma tentativa que tenho por inefficaz, pelo menos. O Brasil precisa de milhões de estrangeiros. Não lhos podemos dar. Ha de procural-os em outros paizes. Mas, como é um paiz que se sabe governar e que nunca, nem sob este nem sob o antigo regimen, deixou de demonstrar sentimentos patrioticos e ardor civico, não corre o perigo, que v. ex.a entreviu na colonização italiana e alleman, de se desnacionalizar. Com mais vagar, em um opusculo, hei de deixar demonstrado quanto estão afastados da realidade os que pensam como v. ex.a. Se houvessemos de iniciar negociações com a idéa de evitar esse supposto risco, creia v. ex.a que os brasileiros, cuja hospitalidade tive durante dezeseis annos e cujo espirito conheço, não agradeceriam o aliás generoso empenho, porquanto nelle veriam menos apreço pelas qualidades de intelligencia e de patriotismo, de que, com justiça, se ufanam muito mais do que das riquezas naturaes da sua patria. Sei que v. ex.a, meu illustre correligionario, só é movido por altos e nobres estimulos. Estou convencido de que só á falta de documentos directos e de observação propria se póde attribuir o desvio do seu grande espirito critico em materia em que estudos especiaes dão a v. ex.a merecida auctoridade. Felizmente, porém, entre muitas idéas de real utilidade que constam da proposta de v. ex.a, vejo uma que me garante que o problema, nas suas linhas mestras, tem em v. ex.a o paladino ao lado do qual se poderão alinhar os soldados da democracia portuguesa e os cidadãos da grande Republica Brasileira. Refiro-me á idéa de procurar approximar os dois povos pela adopção de um espirito commum na legislação de ambos. Nesse ponto estou enthusiasticamente com v. ex.a, porque, não podendo a democracia pura, que é a Republica dos Estados Unidos do Brasil, seguir a evolução regressiva, essa aspiração impõe-nos, a nós portugueses, a marcha progressiva para a situação juridica do Brasil―o que só poderá ser conseguido por uma transformação politica e social, tão almejada por mim quanto por v. ex.a. E comprehendo com que intimo constrangimento quem assim sente teria de obedecer ás regras protocolares do cargo ao pedir ao joven rei D. Manuel a sua cooperação para um emprehendimento que só póde ser levado a bom termo pelos dois povos e que só se desentranhará em realidades promissoras quando a realeza portuguesa constituir méra recordação historica. Faço votos por que v. ex.a veja em breve realizadas as nossas aspirações communs. Se, porém, o nosso esforço interno não chegar para tanto, creia v. ex.a que, para não falharem os seus destinos historicos, o Brasil e Portugal se hão de approximar cada vez mais e cada vez mais intensamente a democracia brasileira ha de exercer fatal acção sobre a nação portuguesa, abreviando os dias do regimen monarchico e apressando o advento da Republica Portuguesa. Não ha mais eloquente lição do que a dos factos. Não ha mais violenta propaganda do que a comparação antithetica dos povos brasileiro e português. E, cada português, que volta á patria, não tarda em sentir a magnitude da acção da Republica no Brasil e em reconhecer a falta das instituições a que lá se afizera. Garanto-o a v. ex.a: se não fizermos a revolução, o Brasil ha de republicanizar Portugal. V. ex.a conhece melhor do que eu o poder da osmose social.» Eis a origem deste trabalho. Julguem brasileiros e portuguêses se as convicções, que elle traduz, carecem de fundamento

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